Para onde vão os comentários do Diário Económico? Talvez para Nárnia...

Há cerca de uma semana Vital Moreira publicou um artigo no Diário Económico sobre o polémico TTIP (Transatlantic Trade and Investment Partnership).

Que Vital Moreira tenha desempenhado no Parlamento Europeu as funções de Presidente da Comissão de Comércio Internacional diz muito sobre a forma como uma parte da esquerda engoliu acriticamente a propaganda da globalização, agora denominada de mercado livre ao abrigo da retórica elegante dos liberais para quem cortar é reestruturar e despedir é requalificar.

Com um maniqueísmo impróprio para um partido que se quer moderado – e, porque não dizê-lo, democrático – Vital Moreira separa as águas entre os apologistas da liberalização comercial e os outros, “eles”, uma choldra de “anticapitalistas, antiliberais e antiglobalização”, que têm por “ideal não confessado” a “Coreia do Norte, Cuba ou os regimes bolivarianos”. Toma lá que já almoçaram.

Em boa verdade poderemos presumir que Vital Moreira tenha, com este artigo, insultado muitas pessoas no interior do próprio Partido Socialista. O TTIP está longe de ser consensual e o modo como tem vindo a ser delineado, longe da vista dos cidadãos Europeus, revela bem o medo que a União Europeia tem dos seus cidadãos. No entanto estão em causa questões fundamentais para o nosso futuro como a redução de barreiras regulatórias às trocas comerciais de grandes grupos económicos em domínios essenciais como a alimentação e a saúde, a legislação de segurança, a legislação ambiental, regras de regulação bancária e os poderes soberanos de cada nação perante empresas estrangeiras.

O artigo publicado no Diário Económico mereceu naturalmente vários comentários críticos, sem que os comentadores recorressem ao insulto – posso testemunhá-lo por ter redigido um desses comentários. No entanto, a pouco e pouco, essas opiniões dos leitores foram-se eclipsando da página daquele jornal, até não restar nenhuma.

O que leva a presumir que, das duas uma, ou o sistema de comentários do Diário Económico está baralhado e gosta de enviar algumas mensagens para Nárnia ou alguém faz uso do sistema de “cinco denúncias” para apagar as opiniões indesejadas. Tendo em conta o tom coerente dos comentários que se podem encontrar na página daquele jornal talvez seja de temer a segunda hipótese.

Estaremos assim perante um bom exemplo do funcionamento do mercado livre, com a regulação dos comentários entregue à espontaneidade do “mercado dos comentadores”. Que desse exercício resulte afinal uma pequena forma de censura é algo que não deve deixar de nos fazer reflectir sobre tamanha liberdade.

1 comentário:

  1. Já comentei no Diário Económico e se for a criticar o texto, o comentário desaparece rapidamente. Não me parece que sejam só cinco polícias da internet… em artigos antigos (lembro-me de um sobre o Benfica, onde questionei o interesse e o destaque) os meus comentários duraram minutos, se tanto, mantendo-se por lá cenas da maior boçalidade.
    Eu agora rio-me quando me falam que havia censura no antigo regime… nem se compara, porque apesar da censura ter sempre algo de arbitrário, existiam pelo menos umas linhas gerais e o leitor estava paradoxalmente mais atento que o leitor do presente. Hoje há auto-censura, censura interna não declarada, censura interna vagamente declarada e este tipo de censura que o Económico pratica. Nunca se sabe muito bem qual é a voz do dono a que obedecem estes jornais. -- José Rui

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